top of page

PERFORMANCES

Clique nas fotos para vê-las ampliadas.

MARCOS - Olubajé (2014)

performance-ritual

7 de maio de 2014, no I Simpósio Internacional de Filosofia Pop, na UNIRIO.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Veja acima o vídeo da ação.

Os performers Sylvia Heller e Marcelo Asth ritualizaram seus momentos de descoberta de diagnóstico de câncer, seus processos de tratamento e suas celebrações de cura em um diálogo intergeracional, como marcos em comum em suas vidas. Os performers ritualizaram este momento conectados por um longo fio preso aos pés, que tanto liga as histórias em comum quanto ilustra a expressão "estar por um fio". Realizaram a ação enquanto o catering de abertura do simpósio era servido a todos os convidados, estando posicionados frente ao serviço da mesa, colocando-se sobre um plástico-bolha - espaço liminar de realização da performance. Com o movimento dos performers, o som do plástico-bolha remete, dentro da proposta, ao espocar do surgimento e à multiplicação das células cancerígenas num corpo - estando no fim da ação (momento de cura), com um som quase ausente. Apesar de ser um ritual conjunto, cada um realizou sua própria ação ritualística de rememoração e cura. A ação ocorreu, ao máximo, de forma silenciosa - assim como a doença se manifesta no corpo.

Marcelo trazia em seu corpo 8 caranguejos amarrados (em referência aos 8 pontos de descoberta de metástase no momento do diagnóstico de seu linfoma de Burkitt). O signo de Câncer tem como representação o caranguejo, além da dor nos órgãos ser comparada às das fisgadas das garras do animal. Omulu/Obaluaê é o orixá da doença e da cura, da vida e da morte, tendo, em sua infância, sido abandonado por sua mãe Nanã num mangue próximo ao mar, por nascer com feridas pelo corpo. Com seu choro, caranguejos se aproximaram e o feriram mais ainda, com suas fisgadas lancinantes. No entanto, este orixá foi envolvido pelo carinho maternal de Yemanjá e se curou de todas as feridas.

Essa performance aconteceu diante de uma mesa repleta de alimentos e bebidas, durante o coffee break do evento, remetendo à grande festa que terreiros de candomblé fazem em homenagem a Omolu/Obaluaê: o OLUBAJÉ.

O Olubajé é uma cerimônia propiciatória, pública, de comunhão, em que se repartem entre os presentes as comidas votivas favoritas do orixá Omolu/Obaluaê. Ao mesmo tempo, diante da mesa dos alimentos e dos espectadores que assistiam a performance comendo, bebendo e interagindo com a ação, o cheiro desagradável dos caranguejos mortos pendurados no corpo do performer Marcelo Asth e a visualidade marcante do falso sangue tingindo a indumentária da performer Sylvia Heller revelavam certos aspectos desconfortáveis e incômodos entre público e artistas, mesmo sendo uma ação relacional e participativa - contando também com o fato de nosso tema ser o câncer.  


Marcelo trazia amarrado no centro de seu peito um cateter venoso port cath - instrumento que facilita o acesso direto da quimioterapia à veia aorta. Este aparelho, que era implantado de forma sub-cutânea no peito do artista, na ação vinha espetado por 8 seringas. 


Em seu bolso trazia laudos e fotografias do período de seu tratamento. A cada lembrança revisitada e compartilhada com o público, o performer retirava uma seringa do port cath e espetava a foto ou laudo em um dos seus caranguejos. 


Após todas as lembranças espetadas, Marcelo oferecia ao público uma máquina de raspar cabelos, revisitando também um importante momento ritual de seu tratamento. As pessoas cortavam seu cabelo numa ação que remetia tanto à doença como, por exemplo, um processo de ritual budista de um monge, em despojamento dos cabelos e da vaidade. Por fim, Marcelo cobriu sua cabeça com uma bandana verde, que utilizou durante todo o processo de tratamento e cura de seu câncer, no ano de 2007 - quando tinha 19 anos - a partir de um sonho que teve com africanas que davam a bandeira de seu país (completamente verde) a ele para que a colocasse na cabeça num período difícil que estaria ainda a passar. Esse sonho se deu semanas antes do diagnóstico.


Já Sylvia trajava uma burca - elemento que vela o corpo feminino e separa em camadas as relações. A burca foi inserida nesta performance também como cobertura do ponto onde sua doença foi constatada: o câncer de mama é cada vez mais recorrente nas mulheres. O que isso significa, socialmente? Fora da burca, apenas seus cabelos brancos se revelam, apresentando também o momento quando se deu seu diagnóstico, prestes a completar seus 70 anos – sendo este também um ritual de transição para uma nova fase. A burca faz pensar: como sabemos o que se manifesta dentro de um corpo? Também faz pensar, como no conceito de Doenças da Alma, de Platão, que as relações humanas tanto contribuem para manifestações positivas como também podem contribuir para o surgimento de doenças. 


A performer tinha em sua burca diversos cateteres e seringas carregadas de tinta vermelha, que pingavam durante a ação. Sobre a burca, fotos de seu seio expondo uma cicatriz (um marco) da cirurgia, laudos e exames médicos que convidavam o público a se aproximar e conhecer mais sua história - numa exposição relacional. Sylvia também trazia consigo um pote com tinta vermelha e um pincel, que podiam ser utilizados pelos participantes para pintar sua vestimenta, marcando sua história.

No momento final da ação, o fio que os unia foi cortado e os dois performers se despiram de suas memórias, apresentando-se em nova etapa.

Concepção: Marcelo Asth e Sylvia Heller
Fotografias: Anna Heller e Tania Alice
Vídeo: Anna Heller 
Edição: Marcelo Asth

bottom of page